Jericó acordara cedinho trazendo ainda no rosto dos
seus habitantes a alegria contagiante da passagem de Jesus. Os comentários
sucediam-se; não faltavam opiniões, as mais diversas; pessoas emocionadas;
gente simples que tomara ares de vida nova... Tudo resplandecia. A cidade
respirava um ar diferente apesar do parecer contrário de muitos a respeito do
ocorrido no dia anterior: o jantar de Jesus e seus discípulos na casa de
Zaqueu. É que eles ainda não se tinham dado conta destas palavras: “Eu vos digo que do mesmo modo, haverá mais
alegria no céu por um só pecador que se arrependa do que por noventa e nove
justos que não precisam de arrependimento” (Lc 15,7). Parece-me ouvir nitidamente a voz de Jesus
repetindo aos insatisfeitos o que dissera alguns dias antes aos seus
discípulos: “O que vos parece? Se um
homem possui cem ovelhas e uma delas se extravia, não deixa ele as noventa e
nove nos montes e vai à procura da que se perdeu? Se consegue encontrá-la, em
verdade vos digo, terá maior alegria com ela do que com as noventa e nove que
não se extraviaram” (Mt 18,12-13). Eles por certo ainda não haviam
entendido “a lógica” de Jesus, e
muito tempo ainda decorreria para que entendessem que “a sua lógica não tem lógica”, visto que o Reino não chegara para “os sábios e entendidos”.
“Ao sair de
Jericó com os seus discípulos e grande multidão, estava sentado à beira do
caminho, mendigando, o cego Bartimeu, filho de Timeu”.
Alber+ Nolan nos explica que “os pobres eram, em primeiro
lugar, os mendigos. Estes eram os doentes e aleijados que tinham recorrido à
mendicância, haja vista a impossibilidade de serem empregados e não possuírem
patentes que pudessem ou quisessem sustentá-los”. Era o contraste que se
deparava diante de todos. Ainda há pouco as cores da alegria; no instante presente a máscara da
tristeza, da miséria e da opressão. Bartimeu, além de mendigo, era cego.
Excluído e humilhado pela sociedade,
perdera a vergonha de estender as mãos para angariar míseras moedas para o seu
sustento. Aprendera na dor a ser humilde; aprendera na obediência a Deus a
viver sem murmurar; aprendera a aceitar a sua condição de dependência e
opressão. Aprendera de maneira dinâmica e não de maneira estática, a acolher a
sua condição limitada. Dentro dele latejava a ânsia de lutar por dias melhores.
Sentia em sua alma alguma coisa que falava não sei o quê... Ele não
compreendia, mas sentia profundamente que aquela coisa... É como se
pressentisse algo. Era chegado o tempo de descruzar os braços.
Seu tato era extraordinário. Poderíamos afirmar,
sem receio, que ele enxergava pelas mãos, pelos dedos. Por outro lado, a sua
capacidade auditiva era extremamente acurada. Não tendo capacidade para
detectar a luz, desenvolvera a capacidade de detectar as formas e os sons. Aqueles
sons que se aproximavam do lugar em que estava mendigando, um alarido não muito
constante em Jericó, tornara-se o sinal indicativo de que um personagem
importante estava deixando a cidade. À medida que a multidão se aproximava,
mais ele apurava os ouvidos. “Quando
percebeu que era Jesus, o Nazareno, que passava, começou a gritar: _Jesus,
filho de Davi, tem compaixão de mim!” Ele naturalmente não viu; mas através
do vozerio identificou que era Jesus. E começou a gritar, clamando por
misericórdia Àquele que é “a luz do
mundo e o caminho, a verdade e a vida” (Jo 8,12; 14,6).
“E muitos o
repreendiam para que se calasse. Ele porém, gritava mais ainda: _Filho de Davi,
tem compaixão de mim!” A
insistência e a persistência de quem luta por aquilo que quer e deseja, e
anseia, e busca, e pede, e clama... Encontra ressonância aos ouvidos do Senhor.
“Detendo-se,
Jesus disse: _Chamai-o!” Jesus pára
e manda chamá-lo. Diante da miséria humana Jesus nunca segue adiante. É o Bom Pastor
que cuida da ovelha doente; e o Bom Samaritano que trata das feridas da ovelha
machucada.
“Chamaram o
cego, dizendo: _Coragem! Ele te chama. Levanta-te! Deixando a sua capa,
levantou-se e foi até Jesus”.
A indumentária que o oprimia, escravizava e humilhava,
a partir de agora deixara de ter sentido. Aquela capa que fora símbolo de
exclusão social foi atirada longe. O que importava era levantar-se o mais
depressa possível e chegar até Jesus.
Naquele instante os olhos da LUZ encontraram os
olhos sem luz. E no Coração de Jesus afloram as palavras proferidas na sinagoga
de Nazaré: “O Espírito do Senhor está
sobre mim porque ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para
proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para
restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar o ano da Graça do Senhor”.
Diante dele Bartimeu, pobre, mendigo, cego, cativo, preso, oprimido...
“Então Jesus lhe disse: _Que queres que eu
te faça? O cego respondeu: _Mestre, que eu possa ver novamente!”
Jesus respeita a nossa liberdade. Por isso a razão
da sua pergunta. Ele queria que Bartimeu verbalizasse, apesar de saber e vê-lo
cego. Quando ele expressou o seu desejo de cura, “Jesus lhe disse: _Vai, a tua fé te salvou! No mesmo instante ele recuperou
a vista e seguia-o pelo caminho”. São palavras que curam o corpo, a alma e
o coração.
“O cego não
é aquele que não vê, mas aquele que não quer ver”. Quantos passam a vida sentados à beira do caminho,
braços cruzados, olhos perdidos no vazio e na escuridão, acomodados,
desencorajados, desesperançados, descrentes de Deus, descrentes do mundo,
descrentes das pessoas... Mortos vivos ou vivos mortos? Em qual das duas
categorias você se ajusta? Jesus está passando agora na rua do seu coração. Não
deixe esta graça passar sem realizar o que Deus quer. Peça, busque, clame,
grite, como Bartimeu: “Jesus, filho de
Davi, tem compaixão de mim!” Clama com as palavras que o Espírito Santo te
inspirar: “Jesus, eu só enxergo as coisas
do mundo. O meu coração e os meus olhos encharcados de concupiscências, de
pecados, de vícios, de egoísmo, de orgulho, de vaidade, de adultério, de
rancor, de homossexualismo... Eu sou cego para o amor, para o perdão, para a
misericórdia, para a disponibilidade, para o serviço aos irmãos, para a
partilha; eu sou cego para a humildade, para o desprendimento, para a renúncia,
para o
despojamento de mim mesmo. Tem compaixão de mim!”
E os teus olhos se abrirão; tua alma exultará; teu
espírito haverá de cantar as misericórdias que o Senhor realizou na tua vida.
Mas não basta apenas isto. É necessário exercitar a
fé. É seguindo Jesus pelo caminho, como fez Bartimeu, que se cumpriram as
palavras de Jesus em sua vida: “Vai, a
tua fé te salvou”.
Paz e Luz
Antonio Luiz Macêdo
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