CURSO
BÍBLICO-TEOLÓGICO
1. Conceito
A palavra 'hermenêutica' vem do verbo 'hermenêuein' (interpretar). E
esta interpretação foi entendida diversamente através dos tempos. Por isso,
temos três tipos de exegese: l. rabínica; 2. protestante; 3. católica.
2. Exegese Rabínica
Os judeus interpretavam a escritura ao pé da letra, por causa da noção
de inspiração que tinham. Se uma palavra não tinha sentido perceptível
imediatamente, eles usavam artifícios intelectuais, para lhes dar um sentido,
porque todas as palavras da Bíblia tinham que ter uma explicação. O exemplo do
paralítico é antológico: ele passara 38 anos doente. Por que 38? Ora, 40 é um
número perfeito, usado várias vezes na vida de Cristo (antes da ressurreição,
no jejum) ou também no AT (deserto, Sinai). Dois é outro número perfeito,
porque os mandamentos (vontade) de Deus se resumem em "2": amar Deus
e ao próximo. Portanto, tirando um número perfeito de outro, isto é, tirando 2
de 40 deve dar um número imperfeito (38) que é número de doença...
Alegoria pura: neste sentido se entende a condenação de certas teorias
que apareceram e eram contrárias à Bíblia (caso de Galileu). Assim era a
exegese antiga. No século XVIII, o racionalismo fez o extremo oposto desta
doutrina: negaram tudo que tinha alguma aspecto de sobrenatural e mistério, e
procuravam explicações naturais para os fatos incompreensíveis, assim por
exemplo, dizendo que Cristo hipnotizava os ouvintes e os iludia dizendo que era
milagre. JC não ressuscitou, mas ele apenas havia desmaiado na cruz, e quando
tornou a si saiu do sepulcro... Talvez não o fizessem por maldade. Era por
principio filosófico.
A Igreja primitiva herdou muito do rabinismo, no início, mas depois se
libertou. Começaram por ver na Bíblia vários sentidos: literal, pleno e
acomodatício. Literal: sentido inerente ás palavras, expressão pura e simples
da ideia do autor; Pleno: fundado no literal, mas que tem um aprofundamento
talvez nem previsto pelo autor. Deus pode ter colocado em certas palavras um
significado mais profundo que o autor não percebeu, mas que depois se descobre.
Deus, como autor, fez assim. A palavra do profeta se refere a uma situação
histórica; a palavra de Deus se refere ao futuro. Acomodatício: é a acomodação
a um sentido à parte que combina com as palavras. É a Bíblia aplicada à
realidade apenas pela coincidência dos textos. Por exemplo, em Mt se lê
"do Egito chamei meu filho"... para que se cumprisse a Escritura. Mas
o sentido, ou seja, a aplicação original deste trecho não se referia à volta da
Sagrada Família, mas sim à saída do Povo do Egito. Esta acomodação foi
explorada demasiadamente pelos pregadores, que até abusaram disto. Outro
exemplo de acomodação é a aplicação a Maria dos textos do livro da Sabedoria.
Estes são mais literatura que Escritura. Todavia, crendo-se na inspiração,
aceita-se que as palavras do autor podem ter uma significação mais profunda que
a original.
3. Exegese Protestante
Surgiu do protesto de alguns cristãos contra a autoridade da Igreja como
intérprete fiel da Bíblia. Lutero instituiu o princípio da "scritura
sola" (traduzindo, a escritura sozinha), sem tradição, sem autoridade, sem
outra prova que não a própria Bíblia. A partir daquele instante, os
Protestantes se dedicaram a um estudo mais acentuado e profundo da Bíblia,
antecipando-se mesmo aos católicos. Mas o princípio posto por Lutero contribuiu
para um desastre hermenêutico, pois ele mesmo disse que cada um interpretasse a
Bíblia como entendesse, isto é, como o Espirito Santo o iluminasse.
Isto fez surgir várias correntes de interpretação, que podem se resumir
em duas: a conservadora e a racionalista. A conservadora parte daquele
principio da inspiração = ditado, em que se consideram até os pontos
massoréticos como inspirados. Não se deve aplicar qualquer método cientifico
para entender o que está escrito. É só ler e, do modo que Deus quiser, se
compreende. A racionalista foi influenciada pelo iluminismo e começou a negar
os milagres. Daí passou à negação de certos fatos, como os referentes a Abraão.
Afirmam que as narrações descritas, como provam o vocabulário, os costumes, são
coisas de uma época posterior, atribuído àquela por ignorância. Esta, teoria
teve muito sucesso e começaram a surgir várias 'vidas' de Jesus em que ele era
apresentado como um pregador popular, frustrado, fracassado...
Outros ainda interpretavam o Cristianismo dentro da lógica hegeliana:
São Paulo, entusiasmado, teria feito uma doutrina, que atribuiu a JC (tese);
depois São João, com seu Evangelho constituiu a antítese; finalmente São Marcos
fez a síntese. Hoje, porém, se sabe que Marcos é o mais antigo. Estes
intérpretes se contradizem entre si, o que provocou uma certa desconfiança. Por
fim, a própria arqueologia, em auxílio do Cristianismo, veio provar com a
descoberta de vários documentos históricos que a Bíblia tinha razão: aqueles
costumes, aquele vocabulário eram realmente daquela época, inclusive o uso dos
nomes Abraão, Isaac também eram comuns no tempo. Isto e outras coisas serviram
para desmentir tais ideias iluministas.
4. Exegese Católica
Inicialmente, apegou-se muito aos métodos tradicionais: usava mais a
tradição e menos a Bíblia. Mesmo no século XIX, a tendência era ainda conservar
a apologética, a defesa da fé. Foi o Padre Lagrange quem iniciou o movimento de
restauração da exegese católica. Começou a comentar o AT com base na critica
histórica. Mas foi alvo tantos protestos que não teve coragem de continuar. Em
seguida, comentou o NT, e ainda hoje é autoridade no assunto. A Igreja Católica
custou muito a perceber o seu atraso no estudo bíblico, e até bem pouco tempo
ainda afirmava ser Moisés o autor do Pentateuco, quando os protestantes há mais
de um século já descobriram que não.
O primeiro passo da nova exegese da Igreja Católica foi dado por Pio
XII, em 1943, com a encíclica DIVINO AFFLANTE SPIRITU, na qual aprovou a teoria
dos vários gêneros literários da Bíblia. Depois, em 1964, Paulo VI aprovou um
estudo de uma comissão bíblica a respeito da história das formas
(formgeschichte). E hoje em dia, tanto os exegetas católicos como os
protestantes são a favor desta, e qualquer livro sério sobre o assunto traz
este aspecto. Protestantes citam católicos e vice versa, sem nenhuma restrição.
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Fonte: Bíblia Católica Online
Leia as obras de Antonio Luiz Macêdo:
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