CURSO BÍBLICO-TEOLÓGICO
1. Indícios e evidências históricas O período histórico da formação da
Bíblia situa-se entre 1100 a. C. ou 1200 a. C. a 100 d. C. Provavelmente, a
mais antiga parte escrita da Bíblia é o Cântico de Débora, que se encontra no
livro dos Juízes (Jz, 5).
Quando os hebreus chegaram a Canaã, já havia na terra um certo
desenvolvimento literário, como por exemplo, o alfabeto fenício (do qual se
derivou o hebraico), que já existia no século XIV a. C. Os judeus chegaram lá
por volta do século XIII a.C. Outro documento desta época é o calendário de
Gezér, que data mais ou menos do ano 1000 a.C. É uma indicação de datas para
uso dos agricultores. É o documento mais antigo encontrado na Palestina. Outro
documento também muito antigo é o sarcófago do Rei Airam, que contém uma
inscrição e foi encontrado nos séculos XIV ou XV a. C., em Biblos. Há ainda
umas tabuletas encontradas em Ugarit (em 1929), onde estão escritos uns poemas
semelhantes aos salmos, datando dos séculos XIV ou XV a. C.
Além destes, há outros documentos provando que já havia uma escrita na
Palestina, antes dos hebreus chegarem lá. A inscrição do túmulo de Siloé (700
a. C.), explicando como foi feito; os "óstracon", de Samaria, onde há
uma espécie de carta diplomática, são documentos que provam a continuidade de
uma atividade literária. Em Juizes 8,14, o autor descreve um acontecimento
ocorrido mais ou menos em 1100 a.C. E em que língua foi escrito este fato pela
primeira vez, na época em que aconteceu? Provavelmente no alfabeto fenício
(pré-hebraico).
2. A tradição oral e a tradição
escrita
A parte mais antiga da Bíblia remonta justamente deste tempo (1100
a.C.), quando a escrita ainda não estava bem definida, e é oral. Desde este
tempo já se fora criando uma tradição, que existia oralmente e era transmitida
aos novos pelos mais velhos nas reuniões que havia nos santuários. Por este
tempo, só eram relatados os acontecimentos do deserto, do Sinai, da aliança de
Deus com o povo. Mas os jovens queriam saber o que havia acontecido antes
disto. Então foram sendo compostas as histórias dos Patriarcas. Mas, e antes
deles, antes de Abraão? Passaram à história da criação do mundo. Por isso, se
afirma que a parte mais antiga da Bíblia é o Cântico de Débora, no livro dos
Juizes. A partir daí, fez-se um retrospecto didático-histórico.
Como dissemos, estas histórias iam sendo passadas oralmente de pai a
filho, nos santuários. Acontece que nem todos iam para os mesmos santuários, o
que motivou a existência de pequenas diferenças na catequese do norte e na do
sul. A tradição do sul foi chamada de JAVISTA (J), pois Deus era tratado sempre
por Javé; a do norte se chamou ELOISTA (E), porque Deus era tratado como Eloi.
A tradição oral existiu até os tempos de Daví, quando foi escrita a tradição
javista; meio século depois, foi escrita também a eloista. Por volta de 721
a.C., na época, da divisão dos reinos, quando Samaria foi destruída pelos
assírios, muitos sacerdotes do norte fugiram para o sul e levaram consigo a sua
tradição. A partir de então, as duas foram compiladas num só escrito.
Falamos das duas tradições: uma do norte e outra do sul. Mas não
existiam apenas estas duas, que são as principais. Há ainda a DEUTERONOMICA
(D), encontrada casualmente em 622 a. C. por pedreiros, que trabalhavam num
templo. Corresponde ao livro Deuteronômio da Bíblia atual. Após esta, surgiu a
SACERDOTAL (P), nova compilação das catequeses antigas de Israel, datada do
século VI a.C. Ao fim, estas quatro tradições foram combinadas entre si e
compiladas em 5 volumes, dando origem ao Pentateuco da Bíblia atual. Na
tradição Javista, Deus é antropomórfico. Na Sacerdotal, Deus é poderoso, está
acima do tempo, o que significa um progresso no conceito de Deus que o povo
tinha. A redação do Pentateuco se deu pelo ano 398 a.C. e compreendia a
primeira parte da Bíblia judaica.
A partir de Josué, a tradição continuou oral, para ser escrita somente
por volta de 550 a.C. E foram escritas do modo como o povo contava. Por isso
não se pode dar a mesma importância histórica aos fatos descritos nestes livros
em relação a outros posteriores, pois alguns fatos narrados foram baseados na
tradição popular, enquanto que outros foram baseados em documentos de arquivos
(anais do Reino). Este é um grande desafio para os estudiosos e também uma
fonte de divergências.
3. Os Intérpretes - Profetas e
Sábios
Durante muito tempo, os profetas foram os orientadores do povo de Deus.
Os livros proféticos resumem os seus ensinamentos, e na sua maioria foram
escritos só mais tarde, por seus seguidores. Somente por volta do ano 200 a.C.
é que foram redigidos os livros proféticos. Os livros Sapienciais foram o
resultado de um estilo literário que esteve em moda durante muito tempo, na
época posterior ao exílio. São umas reflexões humanistico-religiosas. Passados
os profetas, surgiram os sábios que raciocinavam sobre as coisas da natureza,
tirando delas ensinamentos para a vida. Foram acrescentados aos livros sagrados
nos últimos séculos a.C., sendo os mais recentes livros do AT.
4. A nova tradição da era cristã
O NT não foi escrito com a finalidade de ser acrescentado à Bíblia. No
tempo de Cristo e dos Apóstolos, o livro sagrado era apenas o AT. O próprio
Jesus Cristo se baseava nele em suas pregações. E Ele mandou apenas pregar, e
não escrever. Foi quando uma nova tradição oral foi se formando. E após a morte
de Cristo, os apóstolos saíram pregando.
Mas veio a necessidade de congregar outras pessoas para o anúncio, em
vista do grande número de comunidades existentes. Então, começaram a escrever.
Mais tarde, com a aceitação também de cidadãos estrangeiros nas comunidades, a
mensagem precisou ser traduzida e adaptada. Além disso, o próprio povo
necessitava de uma escrita (doutrina escrita) para se conservar una, após a
morte dos Apóstolos. Esta redação, no início, era apenas de alguns escritos
esparsos, que só depois de algum tempo foram juntos em livros. Exemplo disso
está em Mc 2, uma série de disputas de JC com os Judeus, onde se vê claramente
que foi recolhida de escritos separados. Também em João se lê: "Muitas
outras coisas Jesus fez que não foram escritas..." (Jo 21,24) Isto
significa que só foram escritas aquelas mensagens que teriam utilidade,
conforme as necessidades momentâneas.
O evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito, data dos anos 60 ou 70
d.C.; os de Lucas e Mateus, são de 70 ou 80, o que significa que somente após
uns 40 anos da morte de JC sua palavra começou a ser escrita. 0 Evangelho de
João só foi escrito em torno do ano 100 d.C. Antigamente, se acreditava ser
Mateus o autor do primeiro Evangelho. Mas a critica histórica mostra que o de
Marcos foi anterior. Aliás, a respeito deste evangelho de Mateus, não se sabe
ao certo quem é o seu autor. Foi atribuído a Mateus, apenas por uma tradição e
também por uma praxe da época de se atribuir um escrito a alguém mais conhecido
e famoso, para que a obra tivesse mais autoridade.
5. Entendendo algumas
dificuldades concretas
Durante o tempo anterior á escrita dos Evangelhos, havia apenas a
pregação dos Apóstolos, recordando os fatos da vida de Cristo, todavia eram
fatos esparsos, sem nenhuma preocupação com sequência ou unidade. Por isso os
Evangelhos, que foram esta pregação escrita, se contradizem em algumas datas, o
que mostra a pouca importância dada à cronologia. Os fatos eram recordados e
aplicados, conforme as necessidades. Assim, até entre os Evangelhos sinóticos,
que seguiram a mesma fonte, há diversificações. Por exemplo, no Sermão da
Montanha, em Lucas fala "bem aventurados os pobres"; e em Mateus,
"bem aventurados os pobres de espírito".
A diferença consiste no seguinte: Lucas deu um sentido social, mais
importante para as comunidades gregas, para as quais escrevia. Mas o de Mateus
destinava-se às comunidades judias e queria combater uma doutrina dos judeus
que tinham uma ideia falsa de pobreza. Para eles, o próprio fato de a pessoa
ser pobre, já lhe garantia a salvação, enquanto outra pessoa, pelo simples fato
de ser rica, já estava condenada. Por causa disso ele escreveu "pobres de
espírito". Outro ponto de discordância é o caso da cura de um cego. Mateus
diz "um cego, na saída de Jericó"; e Lucas "dois cegos, na entrada
de Jericó". 0 fato da 'entrada' e 'saída' pode ser explicado pela
existência de duas cidades chamadas Jericó. 0 fato de serem um ou mais cegos
explica-se pelo seguinte: era comum naquele tempo os cegos formarem grupos em
torno de um cego-lider; e o nome deste geralmente era o do grupo. No entanto,
estes detalhes pouco importam ao evangelho. 0 seu interesse é a apresentação da
mensagem (evangélion = boa nova).
6. A fonte comum
Os Evangelistas sinóticos se basearam no Evangelho de Marcos e noutra
fonte, convencionada por fonte "Q", simbolizando os inúmeros escritos
esparsos de que já tratamos. Espalharam cópias destes por outras partes do
mundo. Lucas, Mateus, cada um em lugares diferentes, se inspiraram nos escritos
disponíveis e inclusive no evangelho de Marcos, que na época já havia sido
escrito. O fato do primeiro Evangelho ser atribuído anteriormente a Mateus se
deve a uma afirmação de Eusébio de que Mateus escrevera a "logia" do
Senhor em aramaico. Mas a crítica histórica provou que o Evangelho que
conhecemos não traz apenas a "logia" do Senhor e não foi escrito em
aramaico, e sim em grego. Portanto a noticia de Eusébio se refere a outro
escrito, e não a este evangelho. Nada impede, porém, que tenha sido escrito por
discípulos de Mateus e atribuído ao Mestre. Aliás, a respeito de
"Evangelho", o primeiro a usar esta palavra para indicar as memórias
dos Apóstolos foi S. Justino, em 130 d.C.
7. As Cartas
As cartas de Paulo foram enviadas para serem lidas em público. Em I Tes
5, 27 há uma alusão a isto. Havia também o intercâmbio das cartas, como se lê
em Col 4,16: "mostrem esta carta para Laodicéia e tragam a de lá para
vocês". Aos poucos as cartas foram colecionadas, e no fim do I século já
se tem notícia delas, quando em II Ped 3,15 se lê: "...nosso irmão Paulo
vos escreveu conforme o dom que lhe foi dado... " As cartas de Paulo foram
os primeiros escritos do NT. Não se sabe quando os Evangelhos e elas foram
acoplados, mas já no fim do I século estavam reunidos num só livro.
As Epistolas Católicas (universais) são chamadas assim por se destinarem
à Igreja em geral, e não a tal ou qual comunidade, como fizera Paulo. Elas
também se originaram da necessidade pastoral, e já no começo do II século
estavam incorporadas aos outros escritos do NT. Os Atos dos Apóstolos podem ser
considerados a continuação do terceiro Evangelho, pois também foi escrito por
Lucas. E o Apocalipse de S.João, livro profético, foi acrescentado por último.
Nos escritos do NT, frequentemente se encontram citações do AT. É que
muitas vezes os Apóstolos queriam tirar dúvidas sobre certas passagens, que
tinham falsa interpretação. Nas assembléias, eram lidos escritos do AT e do NT,
para explicá-los. Exemplo disto temos em I Tes 4,15; I Cor 7,10.25.40; At 15,
28; I Tim 5,18; Lc 10,7.
8. O Cânon Sagrado
No século IV, a Igreja se reuniu em Concilio em Nicéia, e uma das
tarefas era organizar o "cânon", ou a lista de livros sagrados
considerados autênticos. Neste Concilio, os livros foram estudados e se
investigou quais os que sempre foram lidos nos cultos e sempre foram
considerados legítimos. E se estabeleceu a ordem ainda hoje conservada. O
motivo pelo qual alguns livros foram postos em dúvida era a grande quantidade
de livros apócrifos, que fazia com que se duvidasse dos verdadeiros. Havia
muitos livros que os judeus não aceitavam. Então os Ss. Padres ponderaram os
prós e contras e definiram a lista que foi aprovada. « 1 2 3 4 5 6 7 ... 61 62
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Fonte: Bíblia Católica Online
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