ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA
No final de sua vida, no que a tradição chama de
“dormição” de Nossa Senhora, contemplamos o dogma que é celebrado neste final
de semana: a Assunção de Maria. Ela foi levada ao céu após a sua peregrinação
terrestre, onde levou a vida acolhendo a vontade do Pai, dizendo “sim” a Deus,
mas também entre cuidados, angústias e sofrimentos. Por isso, segundo a
profecia do santo velho Simeão, uma espada de dor lhe traspassou o coração,
junto da cruz do seu divino Filho e nosso Redentor. Com a Assunção, se crê que
o seu sagrado corpo não sofreu a corrupção do sepulcro, nem foi reduzido à
cinzas aquele tabernáculo do Verbo Divino. Pelo contrário, os fiéis iluminados
pela graça e abrasados de amor para com aquela que é Mãe de Deus e nossa Mãe
dulcíssima, compreenderam, cada vez com maior clareza, a maravilhosa harmonia
existente entre os privilégios concedidos por Deus àquela que o mesmo Deus quis
associar ao nosso Redentor. Esses privilégios elevaram-na a uma altura tão
grande que não foi atingida por nenhum ser criado, excetuada somente a natureza
humana de Cristo.
São João Damasceno, que entre todos se distingue como
pregoeiro dessa grande tradição – que por motivações pastorais no Brasil é
transferida para o primeiro domingo após o dia 15 de agosto –, ao comparar a assunção
gloriosa da Mãe de Deus com as suas outras prerrogativas e privilégios, exclama
com veemente eloquência: "Convinha que aquela que no parto manteve ilibada
virgindade, conservasse o corpo incorrupto mesmo depois da morte. Convinha que
aquela que trouxe no seio o Criador encarnado, habitasse entre os divinos
tabernáculos. Convinha que morasse no tálamo celestial aquela que o Eterno Pai
desposara. Convinha que aquela que viu o seu Filho na cruz, com o coração
traspassado por uma espada de dor, de que tinha sido imune no parto,
contemplasse assentada à direita do Pai. Convinha que a Mãe de Deus possuísse o
que era do Filho, e que fosse venerada por todas as criaturas como Mãe e Serva
do mesmo Deus".
O Catecismo da Igreja Católica explica que "a
Assunção da Santíssima Virgem constitui uma participação singular na
Ressurreição do seu Filho, e uma antecipação da Ressurreição dos demais
cristãos" (966).A Assunção de Maria ocorre imediatamente depois de
terminar a sua vida mortal e não pode ser situada no fim dos tempos, como
sucederá com todos os homens, mas tem de considerar-se como um evento que já
ocorreu. Ensina que a Virgem, ao terminar a sua vida nesse mundo, foi elevada
ao céu em corpo e alma, com todas as qualidades e dons próprios da alma dos
bem-aventurados, e com todas as qualidades e dotes próprios dos corpos
gloriosos. Trata-se, pois, da glorificação de Maria, na sua alma e no seu
corpo, quer a incorruptibilidade e a imortalidade lhe tenham sido concedidas
sem morte prévia, quer depois da morte, mediante a ressurreição.
O dogma da Assunção nos dá uma certeza: Maria
Santíssima já alcançou a realização final. Tornou-se, assim, um sinal para a
Igreja que, olhando para ela, crê com renovada convicção nos cumprimentos das
promessas de Deus. Também nós somos chamados a estar, um dia, com a Santíssima
Trindade. Olhando para o que Deus já realizou em Maria, os cristãos animam-se a
lutar contra o pecado e a construir um mundo justo e solidário para participar,
um dia, do Reino definitivo.
Uma mulher já participa da glória que está reservada à
humanidade. Nasce, para nós, um desafio: lutar em favor das mulheres que,
humilhadas, não têm podido deixar transparecer sua grande vocação. Em Maria, a
dignidade da mulher é reconhecida pelo Criador. Quanto nosso mundo precisa
caminhar e progredir para chegar a esse mesmo reconhecimento!
A Solenidade da Assunção de Nossa Senhora demonstra a
delicadeza de Deus em preservar a Virgem Santíssima da corrupção do pecado
original – seu corpo é elevado ao céu! Daí vem a dignidade do corpo humano, da
vida humana. É para o cristão também um olhar para o seu destino final.
Neste tempo de tantas mudanças é importante que nos
elevemos com Maria. Infelizmente, uma lei aprovada procurando coibir com toda a
justiça a violência contra a mulher trouxe consigo outra grande violência:
contra a vida. Nesse sentido, ao olhar para a Assunção de Maria nós pedimos a
Deus que nos faça testemunhas do Ressuscitado em meio a tantos e complexos
problemas que aparecem a cada momento. Urge nunca perder de vista a direção e
fazer de tudo para que hoje, escutando a voz do Senhor, caminhemos procurando
fazer Sua vontade.
Dom Orani João Tempesta - Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
Fonte: CNBB
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